sexta-feira, janeiro 28, 2005

A MÃO INVISÍVEL DO MERCADO

[crónica publicada hoje no jornal «barlavento»; não disponível online]

No jornal «O Louletano», de 21 de dezembro passado, os comerciantes louletanos da ACRAL - em tempos natalícios de miséria de compras -, viraram as armas para os comerciantes oriundos da China, acusando-os de actividades comerciais eivadas de ilegalidades e sem vigilância. Até aqui, tudo bem, apesar de não serem apresentadas nenhumas provas. Só que a linguagem utilizada, é a manifestação latente de uma xenofobia que pode abrir caminho a discrimações intolerantes.
Pelo vistos o conceito de mercado (leia-se mercado livre para a concorrência entre produtos e empresas) só serve quando interessa aos próprios. Um sentido unívoco que a globalização económica e a mundialização da economia destruiu, extremando a concorrência desenfreada, a deslocalização das empresas e a exploração da mão de obra mais barata. Assim, tudo é possível e o mercado aberto tem destas coisas: a concorrência de produtos baratos a cento e cinquenta ou a trezentos, o uso da mão de obra familiar e a expansão do consumo popular. Ora é exactamente este consumismo que não quer saber das ameaças dos monstros das grandes superfícies que vendem tudo - e até o lazer do fim de semana – ou da beleza arcaica do contraste do comércio tradicional que já tem muito pouco, ou nada, da tradição. Há mais de duzentos anos, o economista Adam Smith criou o conceito célebre da “mão invisível” do mercado. Ora, esta mão invisível já não é a mão da ACRAL, nem a mão dos comerciantes oriundos da China. A mão, bem visível, é a do capitalismo globalizado e dos monopólios que o sustentam. Algo que os estados cada vez mais propiciam e aos quais se subjugam, na sua crescente gestão do estado mercantil. Por estes dias o presidente da nossa república esteve na China, isso mesmo, a dar uma mãozinha.
Mas a atitude perante os estrangeiros tem ainda este sentido: só nos interessam os que nos favorecem! Que venham jogadores de futebol para as lusas equipas, engrossar as contas de clubes SAD e trabalhadores para as empresariais obras, pois sim! Mas outros, que nos façam concorrência, nem pensar! Pois é, o Francis Obikwellu é um excelente paradigma: “é um preto nigeriano a trabalhar nas obras”; depois “é um português genuíno medalhado nas olimpíadas”. Anda aqui a “mão invisível” a criar estereótipos sobre os estrangeiros. Esterótipos perigosos.