domingo, janeiro 01, 2006

Texto de Apoio III

O QUE SÃO ESTUDOS DE CASO

1. Introdução
Entre as muitas formas de abordagem no trabalho de campo, enquanto metodologia de investigação, podemos referir a que é conhecida por estudo de caso. Segundo Merriam (1998, citado por Bogdan e Biklen, 1999:89) este consiste na observação detalhada de um contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documentos ou de um acontecimento específico. Já Adelman (1977, citado por Bell, 1997:22/3), refere-o como um termo global para uma família de métodos de investigação que têm em comum o facto de se concentrarem deliberadamente sobre o estudo de um determinado caso. Este tipo de estudo parece ser mais fácil de realizar do que outros que exigem situações múltiplas ou locais diversificados. O seu grau de realização é variável, de acordo com muitos factores. Talvez por isso ele seja escolhido quase sempre por investigadores iniciados, ou com pouca experiência, ou ainda que actuam sozinhos (Bell, 1997; Bogdan e Biklen, 1999).
Bell (1997) refere mesmo que o estudo de caso tem vantagens, pois pode ser realizado em pouco tempo e de forma aprofundada. Por isso o estudo de caso não se limita a descrever factos, acontecimentos ou histórias, mas tenta analisar a interacção que existe entre eles, bem como a sua importância no contexto de estudo (Bogdan e Biklen, 1999).
Apesar de utilizar diversos métodos de abordagem, no trabalho de campo, o estudo de caso recorre, sobretudo, à observação e à entrevista. Dessa forma pode desocultar aspectos que poderiam ficar escondidos, se fosse outra a metodologia de abordagem da investigação.
A principal crítica que é feita aos estudos de caso é o facto de eles não permitirem a generalização, tão comum na investigação. Como os estudos de caso apreciam, sobretudo, acontecimentos individuais, seria impossível generalizá-los de forma a servirem estudos posteriores na mesma área. Bassey (1981, citado por Bell, 1997:24) refere que o facto de um estudo poder ser relatado é mais importante do que a possibilidade de ser generalizado. No mesmo sentido Bogdan e Biklen (1999) falam deste tipo de constrangimento, defendido por muitos autores, dado a dificuldade em encontrar a situação típica ou atípica (excepcional), mas ao mesmo tempo defendem que na investigação qualitativa em educação, nem sempre a generalização deve existir, pois retira uma certa especificidade a cada estudo. Outros autores como Horton e Hunt (1981) referem que o maior valor dos estudos de caso deve estar na sugestão de hipóteses, as quais poderão ser testadas por outros métodos e dão como exemplos estudos de caso sobre delinquência juvenil e desorganização da personalidade.
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2. Tipologia de estudos de caso
Na investigação qualitativa, em que o estudo de caso tem um papel importante, podem referir-se diversos tipos de estudos (Bogdan e Biklen, 1999):
i) Estudos de caso de organizações numa perspectiva histórica – quando incidem sobre uma organização específica, ao longo de um determinado período de tempo, relatando o seu desenvolvimento. Como habitualmente a recolha de dados baseia-se na entrevista, na observação e em registos escritos;
ii) Estudos de caso de observação – o foco de estudo centra-se numa organização particular (escola por ex.) ou num seu aspecto particular, apesar do investigador ter em atenção a articulação da parte com o todo. A melhor técnica para a recolha de dados é a observação participante, o que determina muitas vezes que o foco de estudo seja sugerido pelo contexto;
iii) Histórias de vida – são estudos em que o investigador aplica entrevistas de forma exaustiva e profunda a uma determinada pessoa, normalmente informadores-chave (ou informantes privilegiados) que denotam grande potencial para obter narrativas pessoais. Estes testemunhos, na primeira pessoa, destinam-se normalmente a fazer compreender os aspectos básicos do comportamento humano ou das instituições existentes (Bogdan e Biklen, 1999:93);
iv) Estudos comunitários – estudos de caso de organizações ou de observação, quando o objecto de estudo se circunscreve a um bairro ou a uma comunidade;
v) Análise situacional – investigação de um determinado acontecimento (situação) do ponto de vista de todos os participantes;
vi) Microetnografia – refere-se a estudos de caso realizados a unidades muito pequenas de uma organização ou actividade.
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3. Constrangimentos dos estudos de caso
Para além do constrangimento da generalização, referido antes, Bogdan e Biklen (1999) referem outros cuidados a ter com os estudos de caso, designadamente: i) a amostragem interna, que designa o facto de se dever ter em atenção a representatividade dos informantes a entrevistar; ii) a amostragem de tempo, que é decisiva na escolha do tempo certo para observar e entrevistar; iii) o tempo a disponibilizar para um estudo de caso, que deve considerar grande flexibilidade e boa gestão do tempo, sobretudo na chamada saturação dos dados.
Podemos ainda falar de estudos de caso múltiplos, quando os investigadores estudam dois ou mais assuntos, ambientes ou bases de dados; e ainda de estudos de caso comparativos, quando dois ou mais estudos de caso são efectuados e depois comparados e confrontados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bogdan, R. & Biklen, S. (1999). Investigação Qualitativa em Educação. Uma Introdução à Teoria e aos Métodos. Porto: Porto Editora.
Bell, J. (1997). Como Realizar um Projecto de Investigação. Lisboa: Gradiva.
Horton, P. & Hunt, C. (1981). Sociologia. Lisboa: McGraw-Hill.
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Resumo: Características do método de estudo de caso
O método de estudo de caso pode assumir algumas características:
a) Permite o enfoque de forma intensiva sobre um determinado problema sem se dispersar por áreas demasiado abrangentes;
b) Determina uma delimitação cada vez mais cirúrgica sobre os problemas em estudo;
c) Possibilita relevar aspectos histórico-biográficos muitas vezes importantes e esquecidos;
d) É um método de estudo para investigadores isolados, principiantes ou com pouco tempo;
e) Ao contrário do que afirma a sua crítica pode ser relatável e por isso constituir matéria para alteração de atitudes, ou padrão de novas aplicações (Bassey, 1981, cit. em Bell, 1997).