quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Histórias de vida da toxicodependência

INVESTIGAÇÃO – Histórias de vida de dois ex-toxicodependentes

METODOLOGIA
Conversas Informais – Surgem num primeiro momento da investigação. O investigador faz uma apresentação de si próprio e do que pretende com o seu trabalho. Procura criar uma relação de empatia com os sujeitos de investigação.

História de vida – Na história de vida, pede-se a alguém que descreva a sua história pessoal. A recolha de uma história de vida envolve uma “crença no indivíduo, uma valorização do eu e da sua história” (Poirier, Clapier-Valladon & Raybaut, 1999, p.89).

Entrevistas Abertas – A pessoa entrevistada fala livremente, sem grande intervenção por parte do investigador, isto para que o sujeito de investigação aborde as questões que realmente julga serem as mais pertinentes.

Diário de campo – Registo do que se passou no terreno de investigação. No caso das Histórias de vida, é importante o registo dos gestos e expressões dos entrevistados, uma vez que é algo que o gravador não consegue captar.

TEMÁTICAS: Adolescência, Drogas, Toxicodependência, A família e o toxicodependente, Exclusão Social, Tratamento, Reinserção Socioprofissional, Papel da Educação e do Educador Comunitário no contexto da investigação

COMUNICAÇÃO
“PASSAGENS DE VIDA DE UM EX-TOXICODEPENDENTE”

INFÂNCIA
- Infância normal
- Marcada por sensibilidade e rebeldia
De acordo com Strecht (2004, p.31), as crianças são particularmente “dotadas de uma capacidade de desenvolver o mundo interior desde que nascem, que se organiza sobretudo a partir do que lhes é oferecido por quem está mais próximo: pais, família, amigos, escola, sociedade. É impossível falar ou descrever uma criança isoladamente. É sempre necessário fazê-lo no contexto em que ela se insere e onde tem crescido”.
“Variava um bocado entre essa rebeldia de miúdo e depois também de alguma sensibilidade (…) Nunca sofri muito com ela, apesar de ter os pais separados não me lembro assim daqueles grandes traumas de infância (…)”.

ADOLESCÊNCIA
- Evolução da rebeldia
- 1.º Consumo
De acordo com Morel, Hervé e Fontaine (1998), é sem dúvida no coração da adolescência que se situam os primeiros consumos.
“ (…) O meu primeiro consumo tinha para aí os meus 13 anos mais ou menos. Foi erva…foi marijuana.”
Na opinião de Farate (2001), é o grupo quem favorece a ritualização da utilização, recreativa ou adictiva, de determinada substância psicoactiva.

TOXICODEPENDÊNCIA
Neto (1990), diz-nos que o mais habitual é a existência de uma politoxicomania, na qual a pessoa passa de umas drogas para outras conforme a sua disponibilidade e preferência.
“Entretanto aos 19/20 anos, na altura da minha entrada para a tropa, consumo heroína pela primeira vez. (…)”
“Eu nunca deixei de consumir as drogas que tinha começado a consumir, e comecei a consumir heroína e anfetaminas, e às tantas era tudo junto”.
“As minhas memórias da prisão, acho que é provavelmente o sítio mais estranho e mais horrível ao mesmo tempo onde alguém pode entrar”.

TRATAMENTO
Segundo Frazão, Teles, Pereira e Magalhães (2005), o tratamento da pessoa toxicodependente, apesar de ser caracterizado na maior parte das vezes, por uma grande instabilidade e ambivalência, por recaídas e interrupções mais ou menos longas e por abandonos, pode ser bem sucedido.
“Quando sai da prisão tive cá fora uns tempos e foi ai que eu tentei fazer o meu primeiro tratamento em relação às drogas.”
“Acho que eu parei muito por começar a não ter saída, não havia caminho por onde seguir e onde estar a usar sem estar cada vez pior e sem as coisas estarem cada vez mais deterioradas”.
”Lembro-me que quando entrei tive uma ressaca complicadíssima, tive um mês e meio sem dormir um único segundo, isto pode parecer inacreditável, mas é a mais pura das verdades. (…) Tive uma grande determinação, aguentei…fiz uma ressaca de metadona, comprimidos, de heroína, todas as drogas praticamente a frio. […] percebi que era a última jogada da minha vida e que tinha de apostar ali tudo, apostei tudo.”

REINSERÇÃO
- O entrevistado até reconquistar a confiança da mãe viveu durante um ano num apartamento de reinserção.
Como nos diz Curtet (1997), a reinserção é algo de complicado porque o toxicodependente se marginalizou e provavelmente cortou os laços com a família.
“O primeiro trabalho que tive foi numa barraquinha em que alugava bicicletas, […]”.
“Tinha eu 15 meses de recuperação fui convidado para trabalhar como monitor num centro, desta vez noutro papel, no papel de tentar ajudar os outros um bocado a sair daquilo, e estou lá há 3 anos. Agarrei isso com alguma motivação e gosto imenso do que faço.”

CONSIDERAÇÕES FINAIS
- O entrevistado para além de ser monitor, fazer sessões de animação e trabalho voluntário, está a tirar a carta de condução e tem como objectivo ingressar na Universidade, num curso de Psicologia.
- O papel da instituição que o apoiou, tanto na fase do tratamento como na sua reinserção, foi indispensável. Mas a sua determinação e força de viver, foram sem dúvida as duas coisas que o levaram a estar hoje onde está e a poder partilhar a sua história de vida.
- Este testemunho leva-nos a uma reflexão sobre a problemática em questão e ajuda-nos a compreender que para conhecermos uma determinada realidade e para podermos intervir, temos primeiro que compreender aqueles que fazem parte dessa mesma realidade, pois sem esse conhecimento não poderemos ajudá-los.
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Sandra Cabrita - 4º ano de EIC